GAROTO
GAROTO
de Julio Bressane
de Julio Bressane
Já por seu título, GAROTO é uma prova da jovialidade de seu
diretor. Não estamos apenas falando da juventude dos personagens - dessa época
que funciona como uma penumbra, estado de descoberta - mas da própria juventude
de um projeto de cinema.
No cinema brasileiro, vivemos (conjugo o verbo no passado
recente) um período de renovação de um modo de fazer cinema, quando, em meados
do século XXI, impulsionados pelas possibilidades do digital, uma geração de
jovens realizadores mergulhou na produção de longas-metragens sem necessariamente
se preocupar com o mercado, a aceitação do público e a "performance de
suas carreiras", nem em "formar portfólios", mas simplesmente
movidos pelo desejo ingênuo e louco de fazer um filme. Um projeto jovem de se
fazer cinema.
Mas parece natural propor um cinema jovem quando se é jovem.
O difícil é saber envelhecer. Quando se envelhece, alguns dizem que
"agora, é preciso também pagar as contas". É preciso, então,
"deixar para trás as loucuras saudáveis do tempo de adolescência, e se
tornar adulto", o que quer dizer, fazer um "cinema mais respeitável",
ou ainda, "mais responsável".
O que é formidável no cinema de Julio Bressane é, portanto,
essa aposta radical e incontornável por um projeto de juventude, não como etapa de um processo cinematográfico, mas, ao contrário, de um projeto de resistência.
No entanto, para Bressane, ser jovem não representa essa
adoção direta aos cacoetes da moda do cinema de autor - leia-se o mercado de
arte do cinema internacional. Seu projeto de juventude foi sendo consolidado,
sem pressa, durante os últimos cinquenta anos.
A juventude do cinema de Bressane está em sua aposta franca
pela curiosidade, pela ingenuidade, pelo cinema de descoberta e pelo
descompromisso com a repercussão de
seus filmes.
Bressane pode ser visto como herdeiro do cinema de Mário
Peixoto, por seu suposto intelectualismo e por suas tendências aristocráticas. Mas
uma diferença é que Bressane fez muitos filmes. Eles estão aí, espalhados pelo
mundo. É preciso vê-los.
GAROTO dialoga com diversos desses filmes, mas é, ao mesmo
tempo, um passo para frente. Vemos alguns dos temas de EDUCAÇÃO SENTIMENTAL,
mas aqui, uma enorme diferença, é que GAROTO é quase todo feito em externas. A
oscilação entre o fluxo da natureza ou a aspereza das pedras é um dos temas
desse filme. Namoro tropicalista (modernista) com o cinema de Straub - como, de
outras formas, CLEÓPATRA, também o era: GAROTO é um filme jovem.
Numa época em que dizem que "os jovens precisam
envelhecer", o gesto de Bressane, ao integrar o projeto da TELA BRILHADORA,
nos relembra que é preciso "saber envelhecer". No caso de Bressane, é
notável como esse cineasta que não é mais jovem, preserva-se cada vez mais
jovem, pela sua franca aposta por um cinema genuinamente jovem. Repetindo-se
para não ser nunca o mesmo. Ou seja, nunca repetindo, mas dizendo outra vez,
mais uma vez. O mundo é o mesmo e se transforma. Quando fazemos um filme,
inventamos mundos possíveis. E assim, diante da morte, as coisas vão ganhando vida.
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