O caso de Fabiano Amorim e seu “Derrubaram o Pinheirinho”


Fabiano Amorim é nascido em Palmeiras dos Índios, e atualmente mora em Maceió, Alagoas. Indignado com a superficialidade da cobertura da mídia tradicional sobre a cruel demolição de centenas de casas, vitimando quase 6.000 moradores, na região do Pinheirinho, em São José dos Campos, Fabiano resolveu fazer um documentário. Havia duas grandes dificuldades. Fabiano mora a centenas de quilômetros do local e nunca esteve na região. Além disso, Fabiano nunca tinha feito um filme antes. É um analista de sistemas, que não tem uma formação oficial nem em comunicação nem em cinema. Mas isso não foi obstáculo para o desejo de Fabiano. Praticamente sozinho, Fabiano foi colhendo, em tutoriais e sites na internet, cursos online grátis de como montar um filme no PC de sua casa. Enquanto isso, foi pesquisando, sempre pela internet, imagens e dados sobre o “caso Pinheirinho”. E foi vendo outros documentários, para se inspirar em como estruturar o filme. Resultado: quase um ano depois, em 24/01/2013, Fabiano disponibiliza o documentário “Derrubaram o Pinheirinho” no youtube, com 80 minutos de duração. Em menos de um mês, o documentário atingiu quase 5mil visualizações, além de diversas matérias em sites especializados e até mesmo matéria de capa inteira na primeira página do caderno Viver no jornal impresso de São José dos Campos (O Vale).

O caso de Fabiano Amorim e seu “Derrubaram o Pinheirinho” é um exemplo das transformações da produção e difusão do audiovisual nos últimos anos. Ele é um exemplo de um caso que não é único. Por enquanto, são poucos, mas estão aumentando ao longo do tempo. E mais ainda, mostram que existem, que são possíveis. Uma pessoa sem formação estrita em audiovisual, sem captar recursos públicos pelas leis de incentivo, totalmente sozinho, com um equipamento caseiro, não profissional, que não mora no eixo Rio-São Paulo, mas sim na nordestina Maceió (cidade que, apesar de algumas transformações recentes, não possui uma tradição de produção audiovisual), realiza um documentário de longa-metragem que atinge uma considerável repercussão na sociedade.

O exemplo de Fabiano pode assustar aos mais conservadores. O abismo entre o “profissional” e o “amador” não existe mais. Não é necessariamente preciso pertencer “à classe dos cineastas” para realizar um longa-metragem. Não é necessariamente preciso ter uma quantia razoável de dinheiro para realizar um filme. Não é necessariamente preciso um equipamento de primeira linha para realizar um filme. Não é necessariamente preciso morar no eixo RJ-SP para fazer um filme. Etc, etc.

Fabiano não fez o filme para ganhar dinheiro. Ele o fez com pouco, e o disponibilizou gratuitamente no youtube. Não o inscreveu em nenhum festival ou mostra de cinema. Lá mesmo em Maceió, despertou o interesse da mídia alternativa do Rio e São Paulo, através das redes sociais e do email. O efeito foi se multiplicando.

Fabiano sequer viajou para São José dos Campos, ou entrevistou qualquer pessoa. Ele simplesmente utilizou as imagens, depoimentos e textos já disponíveis, na televisão e na internet. Assim como o youtube foi sua principal biblioteca de pesquisa, nada mais coerente que, ao término do filme, ele o disponibilizasse no próprio youtube. Gratuitamente, assim como ele adquiriu todas as imagens e sons incorporados ao filme. E la nave va.

Desse modo, o grande mérito de “Derrubaram o Pinheirinho”, para além da própria possibilidade de ter sido feito (espantosa – para alguns), é o de “simplesmente” reorganizar um material disponível. Esse material é mediado por uma narração em over – a voz do próprio realizador. Ou seja, o grande desafio dos tempos atuais é conseguir reorganizar toda essa imensa quantidade de material já disponível, e fazer uma reflexão crítica, separar o joio do trigo, e tirar conclusões. É isso o que faz Fabiano Amorim em “Derrubaram o Pinheirinho” e é nisso o que reside a sua contemporaneidade.

O que o filme mostra? A opressão de muitos por poucos. A opressão dos direitos básicos de cidadania por conta da cobiça, da vaidade, do dinheiro e do poder. O modo de produção de “Derrubaram o Pinheirinho” é enormemente coerente com seu tema. Daí sua força. Esse sentimento pode ser extrapolado para muito além da barbárie do Pinheirinho. Mas em como isso contamina a nossa vida no nosso dia-a-dia. Sobretudo como realizadores.

Comentários

Fabiano Amorim disse…
Só uma pequena correção. Foi feita uma entrevista exclusiva para produzir o filme. Entrevistei Jairo Salvador, o Defensor Público de São José dos Campos. Disponibilizei trechos da entrevista no filme e também pus no youtube a entrevista na íntegra, para ajudar outros que queiram fazer algum trabalho sobre o Pinheirinho. Abaixo os links:

Link do filme:
https://www.youtube.com/watch?v=-OqKwup0b8c

Link da entrevista na íntegra:
https://www.youtube.com/watch?v=6Vjtnzjl4JY

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