Existe uma ideia corrente de que, à medida que envelhecemos, passamos a tolerar melhor as limitações nossas, dos outros e da vida, e que chegamos a um equilíbrio (ou é preciso acreditar nele) de que, se a vida não é o que esperamos, ainda assim é possível vivê-la tendo em vista a beleza de pequenos instantes fugazes; apreciar o vaievém do mar, o canto dos pássaros, essas coisas. Envelhecer (amadurecer) seria isso. Não é o que vemos no cinema de Robert Bresson. À medida em que Bresson vai envelhecendo, seu olhar para o mundo se torna mais materialista (materialismo como arma crítica contra o materialismo). Seu cinema continua centrado em personagens jovens (seu cinema sempre esteve interessado na juventude), mas ele deixa a epifania, o “longo caminho que trilhei para chegar até a ti” (Diário de um padre, Pickpocket, O condenado à morte escapou) para mergulhar na sombra da morte ou do suicídio, o “fim inevitável” (Mouchette, O diabo provavelmente, O dinheiro). Me parece indiscutível como O dinheiro é uma obra de maturidade, profundo rigor, profunda justeza entre os fins e os meios, entre o pensamento teórico do autor e sua execução prática, ou ainda (ou melhor), entre a poesia e a práxis, entre a sociedade e o indivíduo, entre o mundo e o espírito. Se a morte já está ali desde o começo – na escolha das cores, dos sons, dos (não) olhares, da posição dos corpos, de como os corpos se locomovem no espaço, da posição da câmera ou de como e quando ela se locomove, dos objetos, etc. – não há também a catarse barroca de um Morte em Veneza. Ao final do filme (marxista, brechtiano), não nos comovemos, não chegamos às lágrimas. É outro tipo de dor. Uma espécie de vergonha por vivermos num mundo assim. Não há compaixão, identificação. O que fazer? Qual é o papel do cinema? Bresson não dá respostas, mas as mesmo tempo é claro que ele as dá, na forma como encenou seu drama moral, que nada tem de moralista. As respostas podem ser vistas através das suas opções. São essas opções que dão a esse filme um tom moral.

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