Mikio Naruse: o esteta da serena melancolia
Nessa última semana vi pelo menos cinco filmes do japonês Mikio Naruse. Belos filmes. A melhor definição para o cinema de Naruse veio de ninguém menos que Akira Kurosawa: “o cinema de Naruse é como um grande rio, com uma superfície calma e uma turbulenta corrente em suas profundezas". Essa definição é linda, pois os filmes de Naruse falam da transformação de um Japão de uma forma menos otimista que os de Ozu: são personagens pobres, amedrontados, melancólicos, marginais, fugitivos. Seus filmes também são “shomin-geki” como os de Ozu e Shimizu, mas Naruse aponta de forma mais clara os reveses do país, o lado amargo, traiçoeiro e ambicioso das pessoas, e como o antigo Japão está irremediavelmente perdido.
Mas a questão é que Naruse apresenta esse cinema de “grande agitação emocional” com um estilo cristalino, límpido, em geral com câmeras paradas e planos gerais, num tom contemplativo, ligeiramente melancólico. Por isso, alguns críticos o associaram com o chamado “mono no aware”, um modo de ser tipicamente japonês, ligado a uma aceitação da consciência da transitoriedade das coisas, uma "serena melancolia". Os melodramas delicados de Naruse revelam de forma íntima as contradições do sonho de progresso da sociedade japonesa. Em geral mostram quão difícil é a busca por um equilíbrio entre, de um lado, a necessidade de reformar esse passado que se foi, e, de outro, fazê-lo sem perder os valores ligados a essa tradição. O tom com que Naruse imprime a seus filmes é formidável, porque espelha uma negação de um esteticismo, a opção por um cinema clássico, que supostamente apaga os vestígios de uma autoralidade, mas que inevitavelmente contaminam a película de uma forma de ver o mundo profundamente pessoal, delicada, elegante e sábia, sem maneirismos ou cacoetes de estilo. Naruse, ao longo da sua filmografia (assim como Ozu), foi caminhando cada vez mais para uma depuração de estilo. Enquanto em seus filmes mudos utilizava expressivas “zooms-in” em uma cena de efeito (ver Kimi to wakarete), seus últimos filmes eram quase todos em câmera parada.
Pretendo comentar alguns filmes de Naruse por aqui, quando tiver um tempo. Pelo menos a extraordinária sequência final de Midareru, com 24 planos, culminando num plano-síntese de tirar o fôlego.
Mas a questão é que Naruse apresenta esse cinema de “grande agitação emocional” com um estilo cristalino, límpido, em geral com câmeras paradas e planos gerais, num tom contemplativo, ligeiramente melancólico. Por isso, alguns críticos o associaram com o chamado “mono no aware”, um modo de ser tipicamente japonês, ligado a uma aceitação da consciência da transitoriedade das coisas, uma "serena melancolia". Os melodramas delicados de Naruse revelam de forma íntima as contradições do sonho de progresso da sociedade japonesa. Em geral mostram quão difícil é a busca por um equilíbrio entre, de um lado, a necessidade de reformar esse passado que se foi, e, de outro, fazê-lo sem perder os valores ligados a essa tradição. O tom com que Naruse imprime a seus filmes é formidável, porque espelha uma negação de um esteticismo, a opção por um cinema clássico, que supostamente apaga os vestígios de uma autoralidade, mas que inevitavelmente contaminam a película de uma forma de ver o mundo profundamente pessoal, delicada, elegante e sábia, sem maneirismos ou cacoetes de estilo. Naruse, ao longo da sua filmografia (assim como Ozu), foi caminhando cada vez mais para uma depuração de estilo. Enquanto em seus filmes mudos utilizava expressivas “zooms-in” em uma cena de efeito (ver Kimi to wakarete), seus últimos filmes eram quase todos em câmera parada.
Pretendo comentar alguns filmes de Naruse por aqui, quando tiver um tempo. Pelo menos a extraordinária sequência final de Midareru, com 24 planos, culminando num plano-síntese de tirar o fôlego.
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