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A Mulher que chora, de Jacques Doillon **½
A Mulher Sem Cabeça, de Lucrecia Martel **
Nanayo, de Naomi Kawase *
Nome Próprio, de Murilo Salles ***
Benzedeiras de Minas, de Andrea Tonacci **
Uma Encruzilhada Aprazível, de Ruy Vasconcelos ***
Não sei se vou conseguir escrever sobre esses filmes, já que os vi há algum tempo. Então escrevo breves notas aqui apenas como registro.
Nanayo, de Naomi Kawase *
Kawase está começando a apontar para um esgotamento, o que já era visível em Floresta dos Lamentos. Nanayo tem momentos bonitos, é delicado como todo filme da Kawase, mas o problema aqui é que ao mesmo tempo quase parece um pastiche de si mesmo. É um dilema: o cinema de Kawase é feito no fio da navalha, com um fiapo, e aqui se vê a fragilidade do roteiro (seus filmes anteriores, mesmo os docs eram muito mais amarrados em termos de narrativa, enquanto este é bem mais livre, mais arriscado portanto). Trechos copiados de seus filmes anteriores (o pé na lama de Floresta dos Lamentos, mais outra festa como em Shara). Há algo interessante sobre a comunicação, que acontece não no nível da língua mas no dos sentidos, mas Kawase parece não conseguir explorar nada além do que alguns meios cacoetes dentro de um suposto “cinema sensorial” que ela já domina (um território conhecido) mas que aqui incrivelmente mostra uma certa dificuldade, talvez pela presença de uma nova diretora de fotografia e câmera, que parece um tanto desconfortável com tudo. Não chega a ser ruim mas em termos de Kawase, seu trabalho mais frágil.
Benzedeiras de Minas, de Andrea Tonacci **
Esse média-metragem, vencedor de um edital do etnodoc, é o primeiro trabalho de Tonacci após o Serras da Desordem, registrando as tradições das benzedeiras em Minas Gerais, uma tradição que se esvai com “os avanços da medicina”. É um filme bastante modesto, tipicamente não é um trabalho pessoal do diretor, mas ainda assim nota-se sua força criativa nos primeiros dez minutos, num trabalho absolutamente impressionante na montagem, especialmente pelo uso extremamente criativo das fusões. Elemento que, ainda assim, não surpreende a quem conhece seus documentários do início dos anos noventa quando o diretor experimentava com o vídeo, e mesmo na parte inicial de Serras da Desordem. Mas ainda assim, esses dez minutos mostram o primoroso trabalho de montagem de Tonacci com sua costumeira parceira Cristina Amaral.
Uma Encruzilhada Aprazível, de Ruy Vasconcelos ***
Esse DocTV está na origem do cinema que atualmente vem sendo feito no Ceará, junto com Vilas Volantes. A sensibilidade de Ruy, a fotografia de Ivo Lopes Araújo, um olhar para o documentário que escapa do narrativo para buscar um mergulho poético, a fuga do Nordeste de sempre, as referências a um cinema refinado (por exemplo Regen, de Joris Ivens), a radicalidade, tudo já está ali neste filme, infelizmente condenado ao esquecimento.
A Mulher Sem Cabeça, de Lucrecia Martel **
Martel tem sido um pouco superestimada, tendo-se em vista sua filmografia com três filmes. Não é que seja ruim, ao contrário, O Pântano, é de fato um grande filme, mas seus dois filmes posteriores, revelam uma cineasta coerente mas nada extraordinário. A Mulher Sem Cabeça é inteligente e instigante. É centrado na questão da memória, e desenvolve com coerência elementos sobre o enquadramento e uso do som. Gosto bastante dos primeiros dez minutos, especialmente do tal acidente com o cachorro. Gosto de outras partes. Mas como um todo soa desigual. Bom mas nada demais. Em se tratando de Martel uma pequena decepção.
A Mulher que chora, de Jacques Doillon **½
Primeiro filme que vejo dirigido por Doillon, que também é ator e faz um filme tipicamente francês, um “filme de câmara”, centrado na doçura e nas dificuldades de um relacionamento amoroso, ou ainda, como o amor é sublime mas ao mesmo tempo pode ser doentio. Extremamente delicado e todo trabalhado para os atores, quase como se fosse um “Cassevetes do cinema francês” (muito mal comparando). Uma mulher fica transtornada quando seu marido a deixa para ficar com outra. A forma como Doillon filma as pessoas, especialmente as crianças, dá ao filme uma lufada de vida, geralmente impressionante e emocionante. Quero ver mais coisas de Doillon, mas por esse achei bem positivo.
Nome Próprio, de Murilo Salles ***
Gostei bastante do filme, a ponto de achá-lo um dos melhores filmes brasileiros de ficção dos últimos tempos. É um filme forte, tenso, que incide na relação entre o processo de criação e a vida, em até que ponto a vida se alimenta do processo de criação, e vice-versa, e até que ponto essa relação é saudável ou doentia. “Escrever é viver, e viver é escrever”. Então tudo faz muito sentido que essa autora seja uma escritora de um blog, e todo o filme – um filme jovem – é centrado na sua dificuldade de ter um relacionamento estável, nas expectativas que ela cria para si mesma em cada pessoa que encontra, em cada situação que encontra, pois ela “está condenada a viver demais”, sofrendo por isso. Ao mesmo tempo, Salles não tem uma visão idealizada da personagem, que não raras vezes tem ações condenáveis, isto é, não é uma heroína nem martirizada. Leandra Leal tem uma atuação formidável, com grande impacto emocional e físico, um dos mais viscerais trabalhos de entrega de uma atriz que eu já vi em muito tempo no cinema brasileiro. Além disso, me agrada muito que mesmo tratando de um certo “submundo moderninho”, Salles resistiu a alguns cacoetes, especialmente no uso do digital e na câmera na mão, fazendo um filme sóbrio, fragmentado, obsessivo mas sem as firulas de um Moodysson, Arronofsky ou coisas do tipo. Um filme corajoso e despojado. Gostei bastante.
A Mulher Sem Cabeça, de Lucrecia Martel **
Nanayo, de Naomi Kawase *
Nome Próprio, de Murilo Salles ***
Benzedeiras de Minas, de Andrea Tonacci **
Uma Encruzilhada Aprazível, de Ruy Vasconcelos ***
Não sei se vou conseguir escrever sobre esses filmes, já que os vi há algum tempo. Então escrevo breves notas aqui apenas como registro.
Nanayo, de Naomi Kawase *
Kawase está começando a apontar para um esgotamento, o que já era visível em Floresta dos Lamentos. Nanayo tem momentos bonitos, é delicado como todo filme da Kawase, mas o problema aqui é que ao mesmo tempo quase parece um pastiche de si mesmo. É um dilema: o cinema de Kawase é feito no fio da navalha, com um fiapo, e aqui se vê a fragilidade do roteiro (seus filmes anteriores, mesmo os docs eram muito mais amarrados em termos de narrativa, enquanto este é bem mais livre, mais arriscado portanto). Trechos copiados de seus filmes anteriores (o pé na lama de Floresta dos Lamentos, mais outra festa como em Shara). Há algo interessante sobre a comunicação, que acontece não no nível da língua mas no dos sentidos, mas Kawase parece não conseguir explorar nada além do que alguns meios cacoetes dentro de um suposto “cinema sensorial” que ela já domina (um território conhecido) mas que aqui incrivelmente mostra uma certa dificuldade, talvez pela presença de uma nova diretora de fotografia e câmera, que parece um tanto desconfortável com tudo. Não chega a ser ruim mas em termos de Kawase, seu trabalho mais frágil.
Benzedeiras de Minas, de Andrea Tonacci **
Esse média-metragem, vencedor de um edital do etnodoc, é o primeiro trabalho de Tonacci após o Serras da Desordem, registrando as tradições das benzedeiras em Minas Gerais, uma tradição que se esvai com “os avanços da medicina”. É um filme bastante modesto, tipicamente não é um trabalho pessoal do diretor, mas ainda assim nota-se sua força criativa nos primeiros dez minutos, num trabalho absolutamente impressionante na montagem, especialmente pelo uso extremamente criativo das fusões. Elemento que, ainda assim, não surpreende a quem conhece seus documentários do início dos anos noventa quando o diretor experimentava com o vídeo, e mesmo na parte inicial de Serras da Desordem. Mas ainda assim, esses dez minutos mostram o primoroso trabalho de montagem de Tonacci com sua costumeira parceira Cristina Amaral.
Uma Encruzilhada Aprazível, de Ruy Vasconcelos ***
Esse DocTV está na origem do cinema que atualmente vem sendo feito no Ceará, junto com Vilas Volantes. A sensibilidade de Ruy, a fotografia de Ivo Lopes Araújo, um olhar para o documentário que escapa do narrativo para buscar um mergulho poético, a fuga do Nordeste de sempre, as referências a um cinema refinado (por exemplo Regen, de Joris Ivens), a radicalidade, tudo já está ali neste filme, infelizmente condenado ao esquecimento.
A Mulher Sem Cabeça, de Lucrecia Martel **
Martel tem sido um pouco superestimada, tendo-se em vista sua filmografia com três filmes. Não é que seja ruim, ao contrário, O Pântano, é de fato um grande filme, mas seus dois filmes posteriores, revelam uma cineasta coerente mas nada extraordinário. A Mulher Sem Cabeça é inteligente e instigante. É centrado na questão da memória, e desenvolve com coerência elementos sobre o enquadramento e uso do som. Gosto bastante dos primeiros dez minutos, especialmente do tal acidente com o cachorro. Gosto de outras partes. Mas como um todo soa desigual. Bom mas nada demais. Em se tratando de Martel uma pequena decepção.
A Mulher que chora, de Jacques Doillon **½
Primeiro filme que vejo dirigido por Doillon, que também é ator e faz um filme tipicamente francês, um “filme de câmara”, centrado na doçura e nas dificuldades de um relacionamento amoroso, ou ainda, como o amor é sublime mas ao mesmo tempo pode ser doentio. Extremamente delicado e todo trabalhado para os atores, quase como se fosse um “Cassevetes do cinema francês” (muito mal comparando). Uma mulher fica transtornada quando seu marido a deixa para ficar com outra. A forma como Doillon filma as pessoas, especialmente as crianças, dá ao filme uma lufada de vida, geralmente impressionante e emocionante. Quero ver mais coisas de Doillon, mas por esse achei bem positivo.
Nome Próprio, de Murilo Salles ***
Gostei bastante do filme, a ponto de achá-lo um dos melhores filmes brasileiros de ficção dos últimos tempos. É um filme forte, tenso, que incide na relação entre o processo de criação e a vida, em até que ponto a vida se alimenta do processo de criação, e vice-versa, e até que ponto essa relação é saudável ou doentia. “Escrever é viver, e viver é escrever”. Então tudo faz muito sentido que essa autora seja uma escritora de um blog, e todo o filme – um filme jovem – é centrado na sua dificuldade de ter um relacionamento estável, nas expectativas que ela cria para si mesma em cada pessoa que encontra, em cada situação que encontra, pois ela “está condenada a viver demais”, sofrendo por isso. Ao mesmo tempo, Salles não tem uma visão idealizada da personagem, que não raras vezes tem ações condenáveis, isto é, não é uma heroína nem martirizada. Leandra Leal tem uma atuação formidável, com grande impacto emocional e físico, um dos mais viscerais trabalhos de entrega de uma atriz que eu já vi em muito tempo no cinema brasileiro. Além disso, me agrada muito que mesmo tratando de um certo “submundo moderninho”, Salles resistiu a alguns cacoetes, especialmente no uso do digital e na câmera na mão, fazendo um filme sóbrio, fragmentado, obsessivo mas sem as firulas de um Moodysson, Arronofsky ou coisas do tipo. Um filme corajoso e despojado. Gostei bastante.
Comentários
pena q (ainda) não consegui escrever mais sobre seu importante filme. bom te ter como leitor. comente mais. um abraço.