Dossiê "Cinema Japonês Contemporâneo e Desconhecido" (III) : Sukida, de Hiroshi Ishikawa
Sukida
De Hiroshi Ishikawa
***
Após seu bem-sucedido filme de estréia tokyo.sora, apenas cinco anos depois Hiroshi Ishikawa lança seu próximo filme, Sukida (Eu te amo). Em muitas medidas, Sukida é um trabalho de continuidade em relação a tokyo.sora, na abordagem delicada do universo feminino e num cinema de mise en scene de tempos largos e enredo quase minimalista centrado em pequenas situações afetivas. Mas há algumas diferenças: a primeira é que ao invés da narrativa fragmentada em diversas mulheres, desta vez Ishikawa se concentra em apenas uma (Yu). Outra é a fragmentação temporal da narrativa: dois personagens principais se apaixonam quando criança mas só irão se reencontrar dezessete anos depois. A narrativa então se divide nesses dois tempos: os primeiros 45 minutos mostram a adolescência dos dois personagens, quando moram no campo; os demais 55 minutos, seu encontro 17 anos depois, já na cidade. A divisão revela uma certa dualidade não exposta em tokyo.sora, que dispunha suas pequenas narrativas de forma bastante livre. No entanto, a divisão explicita uma preocupação por um trabalho de estrutura, nítida no trabalho de enquadramento e composição de personagens. Na primeira parte, no campo, Sukida trabalha com planos abertos, a maior parte durante o dia. Na segunda, na cidade, os planos são fechados e quase todos se passam durante a noite, com uma iluminação sombria. Uma outra mudança significativa está na narrativa: lembrando os recursos de Não Amarás, a primeira parte de Sukida é vistsa pelo ponto de vista de Yu; a segunda, pelo de Yosuke.
Mas se a história de encontros e desencontros de Sukida pode parecer um tanto desgastada, o que nos fascina são os recursos de mise en scene de Ishikawa, a elegância afetuosa com que o diretor opta por tempos mais largos para nos tornar mais próximos dos conflitos internos de seus personagens. Exemplo típico é a sequência em que os dois jovens finalmente se beijam. Durante quase oito minutos temos pequenos gestos, meios olhares, poucas palavras, uma enorme imersão num ambiente físico e uma grande dificuldade de expressar os sentimentos, que no fundo é a tônica de Sukida, e por que não dizer de boa parte do cinema japonês.
Uma marca de Ishikawa são seus planos de transição, com planos angulados em contra plongée do céu, uma leitura a seu modo bem particular dos planos de transição usados por Mestre Ozu.
A narrativa que se desenvolve com pequenas ações e tempos largos revela a angústia de seus personagens, a partir de um olhar delicado e contemplativo, que é a marca de Ishikawa. Prova disso é a bela sequência do acidente da irmão de Yu, em 15 planos sem senhum diálogo, em que a ação principal (o atropelamento) não é mostrado, e o som, extremamente discreto mas brilhantemente usado, contribui para o silêncio das pequenas ações desses personagens.
Ainda que menos radical que tokyo.sora, Sukida comprova as virtudes de Hiroshi Ishikawa, um diretor que merece ser melhor observado, ainda que seus filmes sejam até o momento inéditos no Brasil.
De Hiroshi Ishikawa
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Após seu bem-sucedido filme de estréia tokyo.sora, apenas cinco anos depois Hiroshi Ishikawa lança seu próximo filme, Sukida (Eu te amo). Em muitas medidas, Sukida é um trabalho de continuidade em relação a tokyo.sora, na abordagem delicada do universo feminino e num cinema de mise en scene de tempos largos e enredo quase minimalista centrado em pequenas situações afetivas. Mas há algumas diferenças: a primeira é que ao invés da narrativa fragmentada em diversas mulheres, desta vez Ishikawa se concentra em apenas uma (Yu). Outra é a fragmentação temporal da narrativa: dois personagens principais se apaixonam quando criança mas só irão se reencontrar dezessete anos depois. A narrativa então se divide nesses dois tempos: os primeiros 45 minutos mostram a adolescência dos dois personagens, quando moram no campo; os demais 55 minutos, seu encontro 17 anos depois, já na cidade. A divisão revela uma certa dualidade não exposta em tokyo.sora, que dispunha suas pequenas narrativas de forma bastante livre. No entanto, a divisão explicita uma preocupação por um trabalho de estrutura, nítida no trabalho de enquadramento e composição de personagens. Na primeira parte, no campo, Sukida trabalha com planos abertos, a maior parte durante o dia. Na segunda, na cidade, os planos são fechados e quase todos se passam durante a noite, com uma iluminação sombria. Uma outra mudança significativa está na narrativa: lembrando os recursos de Não Amarás, a primeira parte de Sukida é vistsa pelo ponto de vista de Yu; a segunda, pelo de Yosuke.
Mas se a história de encontros e desencontros de Sukida pode parecer um tanto desgastada, o que nos fascina são os recursos de mise en scene de Ishikawa, a elegância afetuosa com que o diretor opta por tempos mais largos para nos tornar mais próximos dos conflitos internos de seus personagens. Exemplo típico é a sequência em que os dois jovens finalmente se beijam. Durante quase oito minutos temos pequenos gestos, meios olhares, poucas palavras, uma enorme imersão num ambiente físico e uma grande dificuldade de expressar os sentimentos, que no fundo é a tônica de Sukida, e por que não dizer de boa parte do cinema japonês.
Uma marca de Ishikawa são seus planos de transição, com planos angulados em contra plongée do céu, uma leitura a seu modo bem particular dos planos de transição usados por Mestre Ozu.
A narrativa que se desenvolve com pequenas ações e tempos largos revela a angústia de seus personagens, a partir de um olhar delicado e contemplativo, que é a marca de Ishikawa. Prova disso é a bela sequência do acidente da irmão de Yu, em 15 planos sem senhum diálogo, em que a ação principal (o atropelamento) não é mostrado, e o som, extremamente discreto mas brilhantemente usado, contribui para o silêncio das pequenas ações desses personagens.
Ainda que menos radical que tokyo.sora, Sukida comprova as virtudes de Hiroshi Ishikawa, um diretor que merece ser melhor observado, ainda que seus filmes sejam até o momento inéditos no Brasil.
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