Os Olhos Sem Rosto
Os Olhos Sem Rosto
De Georges Franju
DVD dom 5 fev 20hs
***
Falando em crime delicado, nesse final de semana vi o raríssimo Os Olhos Sem Rosto, que saiu em DVD pela magnusopus. Um raro filme de um diretor singular, Georges Franju. Esse DVD é imperdível porque no extra tem um dos melhores curtas (senão o melhor) curta de todos os tempos, O Sangue das Bestas, que depois devo comentar com mais calma.
Os Olhos Sem Rosto se parece, na superfície, um filmeB americano ( o início, com um backprojection nos lembra muito isso) mas lentamente o filme vai relevando “a arquitetura do terror realista” típica de Franju. Um médico tem uma filha que teve o rosto desfigurado por um acidente. Arruma vítimas para tentar fazer um transplante de pele para a filha. Mas fracassa, o que o leva a cometer assassinos em série. A história, quase banal, tem os rumos um tanto diferentes do estereótipo do “cinema fantástico”: aqui, Franju prefere apresentar a brutalidade do mundo nosso do dia-a-dia. O Destino, trágico, envolve os personagens. O médico, assim, ganha uma enorme humanidade, revelada por trás de seu rosto impassível (por trás da máscara de médico, ele sua friamente quando faz a cirurgia...). O filme é tbem uma versão de A Bela e a Fera: a pobre menina conduz o pai a um destino trágico, porque precisa conviver num mundo de máscaras e manter as aparências. Mas o que perturba em Os Olhos Sem Rosto é a elegência da mise-em-scene de Franju: os planos longos, a decupagem austera, o filme praticamente sem diálogos, as intermináveis viagens de carro, os planos de percurso superando os “de ação” (os carros, o pai subindo as escadas, etc, i.e o trajeto é resgatado em sua fisicalidade bruta). Não há música (até há uma chatinha, mas que some), não há diálogos (até há, extremamente contundentes “amanhã será tarde demais”): há o cinema físico, há o “não ter o que dizer”. A sequência em que a menina afinal descobre o laboratório perverso de seu pai é antológica: Franju desvela o circo dos horrores com uma naturalidade crua e difícil. Depois, mostra o canil: os cachorros ladram. Só.
Com isso, Franju apresenta um cinema perverso mas que esconde um lado absolutamente lírico, lúdico, humano, poético. Daí vem seu tão falado lado surrealista. A poética brutalidade da natureza humana. E o destino. Esse pai é um assassino cruel talvez por amar demais a filha. Mas talvez por amar a sua profissão mais do que sua própria filha. E acaba sendo uma discussão sobre ética (na profissão, na família).
De Georges Franju
DVD dom 5 fev 20hs
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Falando em crime delicado, nesse final de semana vi o raríssimo Os Olhos Sem Rosto, que saiu em DVD pela magnusopus. Um raro filme de um diretor singular, Georges Franju. Esse DVD é imperdível porque no extra tem um dos melhores curtas (senão o melhor) curta de todos os tempos, O Sangue das Bestas, que depois devo comentar com mais calma.
Os Olhos Sem Rosto se parece, na superfície, um filmeB americano ( o início, com um backprojection nos lembra muito isso) mas lentamente o filme vai relevando “a arquitetura do terror realista” típica de Franju. Um médico tem uma filha que teve o rosto desfigurado por um acidente. Arruma vítimas para tentar fazer um transplante de pele para a filha. Mas fracassa, o que o leva a cometer assassinos em série. A história, quase banal, tem os rumos um tanto diferentes do estereótipo do “cinema fantástico”: aqui, Franju prefere apresentar a brutalidade do mundo nosso do dia-a-dia. O Destino, trágico, envolve os personagens. O médico, assim, ganha uma enorme humanidade, revelada por trás de seu rosto impassível (por trás da máscara de médico, ele sua friamente quando faz a cirurgia...). O filme é tbem uma versão de A Bela e a Fera: a pobre menina conduz o pai a um destino trágico, porque precisa conviver num mundo de máscaras e manter as aparências. Mas o que perturba em Os Olhos Sem Rosto é a elegência da mise-em-scene de Franju: os planos longos, a decupagem austera, o filme praticamente sem diálogos, as intermináveis viagens de carro, os planos de percurso superando os “de ação” (os carros, o pai subindo as escadas, etc, i.e o trajeto é resgatado em sua fisicalidade bruta). Não há música (até há uma chatinha, mas que some), não há diálogos (até há, extremamente contundentes “amanhã será tarde demais”): há o cinema físico, há o “não ter o que dizer”. A sequência em que a menina afinal descobre o laboratório perverso de seu pai é antológica: Franju desvela o circo dos horrores com uma naturalidade crua e difícil. Depois, mostra o canil: os cachorros ladram. Só.
Com isso, Franju apresenta um cinema perverso mas que esconde um lado absolutamente lírico, lúdico, humano, poético. Daí vem seu tão falado lado surrealista. A poética brutalidade da natureza humana. E o destino. Esse pai é um assassino cruel talvez por amar demais a filha. Mas talvez por amar a sua profissão mais do que sua própria filha. E acaba sendo uma discussão sobre ética (na profissão, na família).
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