Desertum

Dia 11 de fevereiro no CCBB às 17hs estréia meu segundo longa experimental em vídeo, intitulado DESERTUM. Ainda tem coisas para filmar: o “prólogo” e o “epílogo”, que acredito que darão uma força maior para esse trabalho. Mas do que se trata? Das coisas de sempre: um filme sobre o silêncio, sobre a solidão, sobre o distanciamento e a intimidade, um filme sobre a linguagem, um filme sobre mim. A não ser esse prólogo+ epílogo, o filme foi todo filmado quando eu estava em férias na Argentina. Por isso, eu digo que o filme é um “Em Casa versão Argentina”. Mas na estética não se trata tanto disso: enquanto o Em Casa era quase todo em planos detalhe em interiores, o Desertum é quase todo em planos gerais em exteriores; enquanto o Em Casa era quase mudo (som ambiente), o Desertum tem música (uma música esquisitíssima, que só o Ricardo Pretti poderia ter me apresentado). Mas para mim é como se eu fizesse o mesmo filme mais uma vez, o que para mim não chega a ser um retrocesso, apesar de o Em Casa ser muito mais austero e pessoal do que o Desertum.

O Desertum é sobre a questão do estrangeiro. Se o Em Casa era sobre sentir-se estrangeiro em sua própria casa, o Desertum é sobre sentir-se estrangeiro num país estrangeiro. No fundo, os dois são sobre sentir-se estrangeiro consigo mesmo, que no fundo é outra forma de ver a questão do distanciamento e da intimidade. E tudo tbem faz parte de um cinema que não diz mas simplesmente mostra, isto é, um cinema do registro (viva Lumière e viva Mekas).

Nessa Argentina não tem pessoas, há apenas um olhar aparentemente frio e distante sobre tudo, ou seja, sobre a perenidade das coisas. Essa Argentina pode ser qualquer lugar, pode ser inclusive nossa própria casa. O que muda antes ou depois de ter viajado? Na volta tudo está no mesmo lugar. É como se não tivéssemos ido. Mas é claro que fomos.

Por isso sinto uma necessidade de terminar quase da mesma forma do Em Casa. Com a certeza de que é importante viajar, mas que no fundo dá no mesmo. Por isso, tem que terminar na minha casa, na minha casa de sempre. Ou ainda, tem que terminar em mim. Ir é como não ter ido, mas é importante ter ido. Estar lá e não estar lá é estar em lugar-nenhum. Em Desertum não há mais a materialidade dos objetos duros de Em Casa, há apenas um conjunto de “lugares-nenhum”. Dar um conceito a essas imagens estranhas a si mesmas, imagens de uma ausência, é que é talvez o grande desafio formal desse trabalho. Essas imagens banais ganham um sentido exatamente pelo seu não-significado. Nesse sentido, Desertum é um diário de viagem às avessas: o romantismo da viagem é revertido pelo confrontamento consigo mesmo.

Duro é o confrontamento da volta, é ver as coisas no mesmo lugar quando se volta. Sumir por dez dias e ver que tudo está absolutamente na mesma, que na verdade não se faz a menor falta. Os objetos estão no mesmo lugar. A viagem de volta é sempre mais difícil que a de ida. Por isso, tem um mesmo plano de dentro do avião, na ida e na volta: é quase o mesmo plano, mas é um plano outro.

Comentários

Anônimo disse…
pena que eu nao vou estar ai, queria muito poder ver no cinema. estou como sempre muito curioso e dessa vez duplamente pois quero saber que musica eh essa que o ricardo te mostrou. como sempre estou orgulhoso e com certeza de que esses filmes estranhos que fazemos nao sao perda de tempo.
abracos do estrangeiro ha mais de dois meses.
luiz pretti
Cinecasulófilo disse…
luiz, acabei de acabar o final do filme, que está ESTRANHÍSSIMO... fiquei um bom tempo preparando esse final...

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