Tanko (II) - RUA DESCALÇA
RUA DESCALÇA
de J. B. Tanko, 1971
**
O último filme de Tanko para a Herbert Richers é um filme estranho, atípico, um pseudo-filme infantil, um filme de aparências, bem estranho mesmo. Aqui, Tanko se esforça para dar ao filme uma decupagem mais criativa, especialmente na primeira meia hora do filme. O filme é repleto de zooms, às vezes para dar ao filme uma forma ambígua que remete ao documental, outras vezes para alongar a duração do planoo (evitando o campo-contracampo, ou o corte para o detalhe, p ex). Ou ainda trabalhando com a oscilação do foco. Com isso, acaba tendo um vigor de linguagem muitas vezes ausente do cinema de Tanko.
O início do filme após os letrieiros, com uma série de zooms-in em Igrejas da cidade até culminar com os sinos já mostra que Tanko conhece a linguagem cinematográfica, e não é tipo Tv.
O filme tem uma história muito estranha, falando de dois santos (o principal, Joel Barcelos, num dos maiores "miscasting", que prejudica o filme, ainda com uma barba horrorosa...) que convivem com os preconceitos conservadores de uma cidadezinha do interior. Essa história é contrabalançada com o dia-a-dia de uma criança, que vive indecisa entre o modo de vida simples dos "santos" ou a obsessão pelo dinheiro e pelo trabalho de um comerciante da região. O garoto (não sei seu nome e paradeiro...) domina o filme de forma incrível, com um trabalho de entrega emocional e especialmente física impressionante. Há um momento do filme em que soltam o passarinho mais querido dele, e ele parte para bater nas pessoas com uma violência, uma raiva, que está entre as coisas mais impressionantes que vi recentemente. Todo o elenco tem uma entrega corporal notável (o garoto sobe em árvores, as vizinhas atiram abóboras nas outras, etc.).
Todo esse confronto entre o materialismo e o espiritual é a base do filme, e Tanko claramente opta pelo segundo, martirizando os santos, e com isso o filme cai. Mas a crítica aos costumes da cidadezinha vai aumentando, aumentando, até uma parte em que o próprio Tanko vai problematizar toda a construção do filme de forma aguda perto do final. "Você está isolado do mundo... não percebe que tem uma guerra estourando lá fora?" - e aí o filme vira uma parábola política (seriam os santos comunistas?) muito nítida, o que faz com que o filme seja mais estranho. E no final Tanko sugere que o tal santo talvez tenha ficado louco mesmo...
Mas o final fecha com o espiritual ao invés do materialismo. num final cíclico, que remete ao primeiro plano do filme, no interior da casinha dos santos, o menino prefere a vela à caixa de música. Um final bonito, que encerra um dos poucos trabalhos mais pessoais do esquecido Tanko, nesse pseudo-filme infantil que vira uma metáfora política, com um trabalho de decupagem inventivo, mas que tbem comprova que Tanko não é genio, mas artesão, como ele mesmo sempre fez questao de ser conhecido.
Ah, tem as cores, bem bem usadas.
de J. B. Tanko, 1971
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O último filme de Tanko para a Herbert Richers é um filme estranho, atípico, um pseudo-filme infantil, um filme de aparências, bem estranho mesmo. Aqui, Tanko se esforça para dar ao filme uma decupagem mais criativa, especialmente na primeira meia hora do filme. O filme é repleto de zooms, às vezes para dar ao filme uma forma ambígua que remete ao documental, outras vezes para alongar a duração do planoo (evitando o campo-contracampo, ou o corte para o detalhe, p ex). Ou ainda trabalhando com a oscilação do foco. Com isso, acaba tendo um vigor de linguagem muitas vezes ausente do cinema de Tanko.
O início do filme após os letrieiros, com uma série de zooms-in em Igrejas da cidade até culminar com os sinos já mostra que Tanko conhece a linguagem cinematográfica, e não é tipo Tv.
O filme tem uma história muito estranha, falando de dois santos (o principal, Joel Barcelos, num dos maiores "miscasting", que prejudica o filme, ainda com uma barba horrorosa...) que convivem com os preconceitos conservadores de uma cidadezinha do interior. Essa história é contrabalançada com o dia-a-dia de uma criança, que vive indecisa entre o modo de vida simples dos "santos" ou a obsessão pelo dinheiro e pelo trabalho de um comerciante da região. O garoto (não sei seu nome e paradeiro...) domina o filme de forma incrível, com um trabalho de entrega emocional e especialmente física impressionante. Há um momento do filme em que soltam o passarinho mais querido dele, e ele parte para bater nas pessoas com uma violência, uma raiva, que está entre as coisas mais impressionantes que vi recentemente. Todo o elenco tem uma entrega corporal notável (o garoto sobe em árvores, as vizinhas atiram abóboras nas outras, etc.).
Todo esse confronto entre o materialismo e o espiritual é a base do filme, e Tanko claramente opta pelo segundo, martirizando os santos, e com isso o filme cai. Mas a crítica aos costumes da cidadezinha vai aumentando, aumentando, até uma parte em que o próprio Tanko vai problematizar toda a construção do filme de forma aguda perto do final. "Você está isolado do mundo... não percebe que tem uma guerra estourando lá fora?" - e aí o filme vira uma parábola política (seriam os santos comunistas?) muito nítida, o que faz com que o filme seja mais estranho. E no final Tanko sugere que o tal santo talvez tenha ficado louco mesmo...
Mas o final fecha com o espiritual ao invés do materialismo. num final cíclico, que remete ao primeiro plano do filme, no interior da casinha dos santos, o menino prefere a vela à caixa de música. Um final bonito, que encerra um dos poucos trabalhos mais pessoais do esquecido Tanko, nesse pseudo-filme infantil que vira uma metáfora política, com um trabalho de decupagem inventivo, mas que tbem comprova que Tanko não é genio, mas artesão, como ele mesmo sempre fez questao de ser conhecido.
Ah, tem as cores, bem bem usadas.
Comentários
luciano.curi@bol.com.br
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Luciano Curi, vc conseguiu????
Meu e-mail é jfronhosousa@gmail.com