GET YOUR MAN
GET YOUR MAN
de Dorothy
Arzner
1927
Get your man faz parte dos primeiros filmes
dirigidos por Arzner, ainda antes da transição para o sonoro, um conjunto de
três fitas realizadas em 1927 na Paramount. Assim, é uma fita ligeira, especialmente
sob medida para a crescente popularidade de Clara Bow, a “It girl”. Sobreviveram
apenas 4 dos 6 rolos desse filme, mas é perfeitamente possível analisá-lo,
ainda que com essa ressalva.
Adoro essas screwball comedies pre-Code, pois nelas
há uma malícia sexual que surge como crítica social dos costumes conservadores
da sociedade norte-americana e como esses costumes passaram a se modificar
rapidamente a partir de meados dos anos 1920 e nos anos 1930, acelerado com o
crack da Bolsa.
Um homem (Charles “Buddy” Rogers) é prometido a uma
mulher, por laços de família desde que eram bebês. Ele vai a Paris encontrar
sua noiva, mas tudo muda quando ele cruza com Clara Bow. Dois americanos que se
conhecem em Paris, e tudo vira uma grande confusão, pois Bow acaba se
hospedando na mansão da família e despertando o interesse do pai viúvo rs.
É curioso pensar que esses americanos vão se
conhecer em Paris. Assim como outros filmes (lembro do interessantíssimo So
this is Paris, de Lubitsch), parece que Paris é o lugar que representa essa modernidade
dos costumes, que pode encenar coisas que nos EUA não pareceriam tão
verossímeis. Há uma fascinação por parte dos EUA por um certo clima de
frivolidade que emana de Paris.
Adoro o papel das mulheres desses filmes. Como já
expresso pelo título, as duas mulheres (Bow e a noiva) vão agir com os meios
possíveis para se rebelar contra o seu destino e fugir dos casamentos
arranjados. É preciso elaborar uma estratégia e ir atrás dos seus objetivos,
senão eles passam. Essa wit feminina encobre uma visão bastante pragmática e de
empreendedorismo das personagens: os fins sempre justificam os meios. Por trás
do clima de opereta de vaudeville, vejo surgir com muita clareza o espírito
desbravador do empreendedorismo independente do American way of life.
Há uma cena fabulosa nesse filme. Buddy e Rogers se
cruzam várias vezes no mesmo dia ao longo da cidade. Mas eles conversam pela
primeira vez num museu de cera. Bow pensa que Buddy é um dos bonecos mas vê que
ele é real. Antes, há uma cena em que um funcionário do museu abre um dos
bonecos, e dá corda num painel às suas costas, como se fosse a corda de uma
câmera ou projetor. É um indício de metalinguagem. Estamos vendo um filme,
composto por personagens que desfilam dentro de um museu de cera. Em certo
momento, Bow pensa que aprendeu a distinguir os bonecos de cera das pessoas reais,
mas ela se engana. Pois as aparências enganam. A vida é um teatro social de
aparências onde as pessoas se conhecem em museus de cera, como se fossem personagens
de um filme. Por fim, é especialmente mágico o momento dos campos-contracampos
em close quando Bow e Buddy se olham no museu (ver foto do close de Bow). Essa
sequência é um exemplo da sofisticação do cinema de Arzner.
É preciso sempre se lembrar que Arzner começou no
cinema como montadora. Para uma screwball, é fundamental o pacing. Nesse que é
um de seus primeiros filmes, é notável a dinâmica envolvente do filme, e seu
crescendo até o final. Outras cenas se destacam. A engraçada cena em que os
dois (pai e filho) vão cortejar Bow no jardim e o Marquês começa a espirrar. A
delicada cena no jardim em que Bow se oferece e aceita a proposta de casamento
do Marquês.
Talvez essa deliciosa fita ligeira mostre melhor o
estilo e as habilidades de Arzner do que o “mais responsável” e mais bem
produzido Christopher Strong, com Katherine Hepburn. Hipótese a ser melhor investigada.
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