Het mes
A faca
de Fons Rademakers
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Acabei de ver esse filme A faca,
que descobri graças à melhor sala de cinema do Brasil atualmente, que é o site
makingoff. Não conhecia o diretor, o holandês Fons Rademakers. Parece que ele
ficou famoso porque ganhou um Oscar (??!!). Vejo também que Rademakers
trabalhou como assistente com de Sica e com Renoir.
Pensando nisso, de fato, me
parecem claras algumas influências de de Sica e de Renoir nesse filme. Especialmente
num humanismo e no modo como Rademakers encena se utilizando do espaço, de
forma sempre econômica mas brilhante.
Mas o que mais me impressiona no
filme vendo-o hoje, mais de meio século após ter sido feito, é a sua
atualidade. Me parece um conto de fadas sombrio, um falso filme infantil. A
faca basicamente é sobre um garoto que tenta sobreviver, à medida que vai se
tornando adolescente, à medida que vai tomando consciência do mundo à sua
volta.
O mundo que esse menino percebe
digamos que não é muito agradável. Ele se percebe só. A solidão é o tema do
filme. E o destino. Apesar de ter diversas sequências em externas, é um filme
razovalemente escuro. Uma brilhante fotografia. Não imagino esse filme tendo
sido feito em cores.
É uma crônica da infância muito
próxima do melhor tom dos filmes modernos. Esse menino não se sabe bem o que
quer, não se sabe quem ele é. Acompanhamos seus passos. Não há vitimização nem
idealismo da infância. Ao mesmo tempo, não possui muitas firulas de efeito.
Tampouco o menino é pobre, como os personagens de de Sica. Rademakers está
interessado num outro tipo de olhar social. O cinema de de Sica interessa a
Rademakers por outros aspectos para além da “introdução dos almanaques” sobre o
que é neorrealismo italiano. De Renoir parece que o diretor apreendeu que para
fazer filmes é preciso estar próximo ao mundo. Existe um realismo que é sempre
crítico. E é crítico porque é sobretudo humano. Os personagens estão vivos
porque falam pouco, observam mais, e especialmente porque se locomovem num
espaço que não é mero pano de fundo, mas que é dramaturgia. Tanto nos
interiores (inteligentemente decupados) quanto especialmente nas externas, onde
o coração do filme pulsa. É nesse conflito entre a casa e o mundo que o menino
vive.
Em volta de todos os costumes
conservadores do que lhe cerca (a igreja, a família, os militares e escoteiros,
o clube de amigos), o menino se sente só. Não quer pertencer a grupo algum. Tem
vergonha de sua mãe que se deixa vencer. Ao mesmo tempo, acaba furtando uma
faca que lhe dá uma espécie de autoconfiança. Essa faca se torna a sua melhor
amiga. Essa faca representa o seu desejo de ser forte, num mundo repleto de
fracos
Dispensável mas ao mesmo tempo obrigatória, essa faca está
ali para fazer cinema. É bonito que Rademakers tenha dado o nome de seu filme
humanista a esse objeto tão mórbido, tão antigo e tão libertário.
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