o cachorrinho
Uma das experiências visuais mais impressionantes que tive esse ano foi a vista de um cachorrinho na sacada do prédio vizinho ao apartamento da minha namorada. O cachorro – ou cachorra, não sei ao certo – fica ali debruçado no parapeito da janela do segundo andar de um prédio, vendo a vida pela janela. Da primeira vez que vi a cena, com a pressa de sempre, não prestei muita atenção ao fato que julguei corriqueiro. Mas uma semana depois olhei para a sacada e lá estava o cachorrinho de novo, na mesma posição. Essa visão me encantou pois era um misto de uma enorme beleza e ao mesmo tempo uma terrível visão. Era lindo ver o cachorrinho ali vendo a vida pela janela, uma enorme poesia e uma beleza o seu olhar atento, olhos arregalados (ele olhava com prazer) para a vida que ali se passava (basicamente prédios, carros e pessoas). Mas por outro lado doía no coração a possibilidade de o cachorro, por um simples impulso ou mesmo por um tropeção, se atirar da janela direto para o asfalto. Ou ainda, era uma visão de uma imensa solidão, um enorme vazio, que apontava para um conjunto de coisas. O que havia para ser visto? Por que seu dono não se preocupava com o cachorro? O que um cachorro preso o tempo todo dentro de casa pode fazer? Como ele pode ter contato com a vida, como ele pode viver?
A visão desse cachorrinho me encantou e me aterrorizou, porque, num determinado instante, aquele cachorro era eu, e me identifiquei com ele. Comecei a dar adeusinhos para ele, como se quisesse que a vida respondesse para ele, mas de repente fiquei com um baita medo de ele, empolgado com essa resposta, se desequilibrasse, e caísse. Poderia o meu encanto provocar uma morte?
Na minha cabeça de cineasta amador veio imediatamente o desejo de filmar aquele cachorrinho. Ou melhor, de tentar registrar todos esses sentimentos que me vieram à cabeça? Mas como poderia fazer isso? De imediato, veio em minha cabeça um conjunto de referências, que guardo comigo e venho seguindo: eu já vi Five do Kiarostami, já vi os filmes do James Benning. De outro lado, vieram coisas absurdas como Wendy and Lucy ou mesmo os dois Hachikos, que vi há pouco tempo. É claro, me lembrei dos meus amigos do Ceará e do que está acontecendo lá, e me lembrei, também, é óbvio, das cartas-filmadas que venho mandando a eles, e que são pequenas reflexões sobre a natureza do cinema e da imagem.
Mas tudo isso foge da questão principal: como registrar na tela esse sentimento que me invadiu, sentimento de enorme doçura e de terror extremo? Ou ainda, para colocar em outros termos, essa “serena melancolia”? Como o cinema pode registrar isso? (seria ele capaz?) Ou ainda, como colocar isso sem cair no espalhafato, no exótico, no pitoresco, no malabarismo, na pirotecnia, no sentimentalismo melodramático? Como dizer isso sendo “verdadeiro” diante desse cachorro, diante do mundo, diante de mim mesmo?
A visão desse cachorrinho me encantou e me aterrorizou, porque, num determinado instante, aquele cachorro era eu, e me identifiquei com ele. Comecei a dar adeusinhos para ele, como se quisesse que a vida respondesse para ele, mas de repente fiquei com um baita medo de ele, empolgado com essa resposta, se desequilibrasse, e caísse. Poderia o meu encanto provocar uma morte?
Na minha cabeça de cineasta amador veio imediatamente o desejo de filmar aquele cachorrinho. Ou melhor, de tentar registrar todos esses sentimentos que me vieram à cabeça? Mas como poderia fazer isso? De imediato, veio em minha cabeça um conjunto de referências, que guardo comigo e venho seguindo: eu já vi Five do Kiarostami, já vi os filmes do James Benning. De outro lado, vieram coisas absurdas como Wendy and Lucy ou mesmo os dois Hachikos, que vi há pouco tempo. É claro, me lembrei dos meus amigos do Ceará e do que está acontecendo lá, e me lembrei, também, é óbvio, das cartas-filmadas que venho mandando a eles, e que são pequenas reflexões sobre a natureza do cinema e da imagem.
Mas tudo isso foge da questão principal: como registrar na tela esse sentimento que me invadiu, sentimento de enorme doçura e de terror extremo? Ou ainda, para colocar em outros termos, essa “serena melancolia”? Como o cinema pode registrar isso? (seria ele capaz?) Ou ainda, como colocar isso sem cair no espalhafato, no exótico, no pitoresco, no malabarismo, na pirotecnia, no sentimentalismo melodramático? Como dizer isso sendo “verdadeiro” diante desse cachorro, diante do mundo, diante de mim mesmo?
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