trilogia Bill Douglas
My Childhood (1971)
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My Ain Folk (1973)
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My Way Home (1978)
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Bom, de volta à vida depois do concurso, uma coisa muito bacana que vi foi a trilogia do Bill Douglas (My Childhood, My Ain Folk e My Way Home). Bill Douglas é um escocês que fez a sua vida na Inglaterra, e depois de uma infância pobre e difícil, realizou essa trilogia no início dos anos setenta, e esse trabalho está começando a ter o seu devido valor reconhecido apenas recentemente. De inspiração autobiográfica, essa trilogia mostra o próprio autor como Jamie, passando pela infância até a adolescência. De cara essa trilogia me interessa muito, seja pelo tema da infância, pela autobiografia, pela família, pela solidão e incomunicabilidade. É uma pena que Douglas não tenha conseguido fazer mais coisas: depois dessa trilogia, ele fez apenas mais um único filme (Comrades).
Filmada em 16mm, a curta trilogia de Douglas (as duas primeiras partes têm menos de 1 hora cada), de orçamento extremamente baixo, impresisona pelo carinho, pela sinceridade, pelo tom muito particular que Douglas conseguiu imprimir nessas imagens, e é a coisa que eu sempre digo: é nítido o envolvimento do diretor com o projeto, é tão evidente que há toda uma vida ali envolvida, e isso faz com que cada fotograma dessa trilogia seja tão comovente.O filme tem um certo tom de neo-realismo italiano, e algumas vezes pode até nos lembrar de Kes, do Ken Loach, ou de alguns recursos de um certo cinema independente inglês. Mas acontece que Douglas é mais radical: a forma lírica e dura como esse espaço físico entra no filme e a precariedade dos recursos do 16mm entram em total harmonia com o clima de incomunicabilidade e solidão presentes em todo o filme. Além disso, é impressionante a forma simples e expressiva como Jamie é interpretado por Stephen Archibald, o que enche todo o filme de um sentimento indizível. Jamie vive com a avó doente, e tem como companhia as minas de carvão e seu irmão Tommy. Conhece um adulto alemão que faz trabalhos forçados nas minas de carvão, e desenvolvem uma amizade distante, marcada pela incompreensão do idioma. A avó não fala, o alemão não fala, e Jamie então observa, e, claro, observamos com ele, pois o filme é sobre Jamie. A narrativa é contida nas suas possibilidades melodramáticas pela austeridade do diretor, com planos de câmera parada, silêncios expressivos (apesar de, em geral, o filme não ter muitos tempos largos) e pela enorme expressividade das locações, que compõem todo um mundo que fala tanto ou mais que os personagens. É nesse espaço indizível (i.e atraves de uma mise-en-scene) entre esse espaço físico e emocional dos personagens que Bill Douglas reflete de forma simples mas bastante comovente e contundente toda a sua vida, todo o seu sentimento em relação ao absurdo que é para uma criança sobreviver.
Mas a trilogia de Bill Douglas não é um cântico de lamentação sobre a vida. Sua maturidade está em observar as contradições dos personagens (o pai de Tommy, o desequilíbrio da avó de Jamie em My Ain Folk, etc.). Na consciência dessa dificuldade está a possibilidade de sobrevivência de Jamie que, na última parte da trilogia, está justamente na possibilidade da amizade e na arte, no processo de criação.
O que nos faz lembrar no final que, após tudo isso, Bill Douglas pegou sua experiência de vida e, de forma simples, transformou isso num filme: um dos filmes mais humanos e honestos sobre a infância que eu já presenciei no cinema.
* * *
É muito curioso ver como essa trilogia retrata a questão da memória, da infância e da família, combinada com os episódios de Maysa...
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My Ain Folk (1973)
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My Way Home (1978)
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Bom, de volta à vida depois do concurso, uma coisa muito bacana que vi foi a trilogia do Bill Douglas (My Childhood, My Ain Folk e My Way Home). Bill Douglas é um escocês que fez a sua vida na Inglaterra, e depois de uma infância pobre e difícil, realizou essa trilogia no início dos anos setenta, e esse trabalho está começando a ter o seu devido valor reconhecido apenas recentemente. De inspiração autobiográfica, essa trilogia mostra o próprio autor como Jamie, passando pela infância até a adolescência. De cara essa trilogia me interessa muito, seja pelo tema da infância, pela autobiografia, pela família, pela solidão e incomunicabilidade. É uma pena que Douglas não tenha conseguido fazer mais coisas: depois dessa trilogia, ele fez apenas mais um único filme (Comrades).
Filmada em 16mm, a curta trilogia de Douglas (as duas primeiras partes têm menos de 1 hora cada), de orçamento extremamente baixo, impresisona pelo carinho, pela sinceridade, pelo tom muito particular que Douglas conseguiu imprimir nessas imagens, e é a coisa que eu sempre digo: é nítido o envolvimento do diretor com o projeto, é tão evidente que há toda uma vida ali envolvida, e isso faz com que cada fotograma dessa trilogia seja tão comovente.O filme tem um certo tom de neo-realismo italiano, e algumas vezes pode até nos lembrar de Kes, do Ken Loach, ou de alguns recursos de um certo cinema independente inglês. Mas acontece que Douglas é mais radical: a forma lírica e dura como esse espaço físico entra no filme e a precariedade dos recursos do 16mm entram em total harmonia com o clima de incomunicabilidade e solidão presentes em todo o filme. Além disso, é impressionante a forma simples e expressiva como Jamie é interpretado por Stephen Archibald, o que enche todo o filme de um sentimento indizível. Jamie vive com a avó doente, e tem como companhia as minas de carvão e seu irmão Tommy. Conhece um adulto alemão que faz trabalhos forçados nas minas de carvão, e desenvolvem uma amizade distante, marcada pela incompreensão do idioma. A avó não fala, o alemão não fala, e Jamie então observa, e, claro, observamos com ele, pois o filme é sobre Jamie. A narrativa é contida nas suas possibilidades melodramáticas pela austeridade do diretor, com planos de câmera parada, silêncios expressivos (apesar de, em geral, o filme não ter muitos tempos largos) e pela enorme expressividade das locações, que compõem todo um mundo que fala tanto ou mais que os personagens. É nesse espaço indizível (i.e atraves de uma mise-en-scene) entre esse espaço físico e emocional dos personagens que Bill Douglas reflete de forma simples mas bastante comovente e contundente toda a sua vida, todo o seu sentimento em relação ao absurdo que é para uma criança sobreviver.
Mas a trilogia de Bill Douglas não é um cântico de lamentação sobre a vida. Sua maturidade está em observar as contradições dos personagens (o pai de Tommy, o desequilíbrio da avó de Jamie em My Ain Folk, etc.). Na consciência dessa dificuldade está a possibilidade de sobrevivência de Jamie que, na última parte da trilogia, está justamente na possibilidade da amizade e na arte, no processo de criação.
O que nos faz lembrar no final que, após tudo isso, Bill Douglas pegou sua experiência de vida e, de forma simples, transformou isso num filme: um dos filmes mais humanos e honestos sobre a infância que eu já presenciei no cinema.
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É muito curioso ver como essa trilogia retrata a questão da memória, da infância e da família, combinada com os episódios de Maysa...
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