O Cheiro do Ralo
O Cheiro do Ralo
De Heitor Dahlia
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Odeon, qui 23 mar 21:30
Se por um lado o segundo longa de Heitor Dahlia após o fracasso (estético, de mídia, de público) de Nina mostra uma evolução do diretor e esclarece sua proposta de cinema, por outro ele aprofunda as deficiências do filme anterior. Dahlia parece querer promover quase uma espécie de síntese de um certo cinema paulista na forma como apresenta sua visão de cinema e de mundo, muito próximo ao olhar de certos filmes da O2. Um olhar que dialoga também com um certo cinema “independente” americano, ou ainda com as reminiscências ou com os estereótipos desse cinema (de Todd Solondz, Daren Arronofsky e simpatizantes). Por isso temos a sensação de que ao mesmo tempo que é um “filme tardio” (por se inserir tardiamente nessa vertente), é também um filme que mostra um processo, um percurso desse diretor dentro de um cinema brasileiro, de uma possível inserção num certo gueto da tentativa de um cinema “independente” brasileiro de uma proposta mais moderna mas que no fundo se revela profundamente conservadora.
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Dito isto, Nina e Lourenço são meio-irmãos: personagens excluídos, solitários, reflexos de uma sociedade urbana em sua rotina massacrante. Dahlia não quer se apiedar dos personagens e usa estratégias quase opostas: seus protagonistas também fazem ações condenáveis e são oportunistas. Há em comum uma revolta com o mundo e consigo mesmo, mas de que forma esse inconformismo provoca um impulso para a ação, um desejo de transformação da ordem das coisas, de superação dos limites e desafios? Nenhuma, pois “a vida é dura”.
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Um desejo em comer uma bunda. Pagar para comer uma bunda que se ama, pois é mais fácil pagar do que dialogar, ouvir, trocar. Não há troca possível
O amor como uma mercadoria, ou melhor, como mais uma mercadoria. Comprar o mundo, as pessoas, as coisas, aquilo que se ama para não ter que se envolver com as coisas, para não se expor. Para não se sujar com a vida. Mas uma hora ou outra a coisa acaba fedendo, como o ralo do filme. Não adianta querermos fugir: a vida é feita de pessoas e não dá para sair na chuva sem se molhar. É preciso coragem para curar as feridas e viver dadas as cicatrizes. Não dá para fugir de si mesmo. É preciso se olhar de frente.
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Mas como o cinema de Heitor Dahlia lida com isso? De forma rasa, tola, superficial. Como um drama que não dá certo (o jantar
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Que a vida é dura não temos dúvida. O que é preciso é fazer um cinema que diga isso para um espelho olhando-se de frente.
Comentários
aqui é o Juliano, que dirigiu o "..." na MFL2007. Queria falar contigo, mandar um email, agradecendo o cuidado com o filme entre outras coisas. POsso mandar um email? eu tenho um blog ocioso (opondo.bogspot.com) se puder dar uma passada e deixar as coordenadas vai ser ótimo.
além disso, este blog tem sido uma leitura muito prazerosa e fértil.
um abraço,
juliano