mINHA VIAGEM À fORTALEZA (5)
Sábado à Noite
De Ivo Lopes Araújo
DVD 3 mar 10hs
** ½
Esse exemplar do DOCTV vindo do Ceará entra nessa mesma linhagem de produções que vim comentando um tempo atrás, sobre o Acidente, fantástico filme da Teia, de BH. Um filme que quebra todas as expectativas que temos sobre um possível “documentário para a TV”, ou seja, uma proposta moderna, instigante, um trabalho de ponta com o que se vem pensando em termos de linguagem.
Sábado à Noite, filme de Ivo Lopes Araújo, é um documentário livre, com imagens de um sábado à noite pelas ruas de Fortaleza. Ele surpreende primeiro pelo que ele não é. É, como já dissemos, um “anti-doc-para-TV”, no sentido de recusar o tom didático sobre o tema e a ênfase
Mas então o que está no filme de Ivo? Estão a cidade, os carros, as coisas e (às vezes) as pessoas que passam e que ficam. A cidade em preto-e-branco em seus planos estáticos e alongados. O percurso, de carro, ônibus ou van. Há um enorme sentimento e uma enorme tristeza em pertencer àquela cidade. Há um olhar íntimo mas ao mesmo tempo um olhar distante de tudo aquilo. Há uma enorme solidão num sábado preto-e-branco em que o esperado encontro nunca acontece.
É como se todo o filme fosse uma tentativa de encontro que nunca acontece. Um encontro em última instância desse realizador com a sua cidade, ou ainda, desse realizador consigo mesmo, com suas origens. E aí ficamos pensando nos curtas anteriores do Ivo, filmados no Rio, em que toda uma nostalgia da volta para o interior, para o Nordeste, é tão desejada. Mas quando se volta, o que há?
Parece haver uma cidade que é quase igual ao Rio, uma distância de tudo e uma solidão quase iguais ao que havia no Rio. Essa cidade que passa e que ao mesmo tempo fica. É então quase como o mote de Desertum e Em Casa: ao voltar, somos outros e essa casa é outra, então que tudo permanece o mesmo, seja na casa em que nascemos, na casa de hoje ou
Mas é interessante vermos como Sábado à Noite, assim como o Acidente, e assim como (modéstia a parte) o Desertum, problematizam o status de representação da imagem e do registro documental. Uma imagem em câmera parada que funciona como registro é ao mesmo tempo reavaliada de forma altamente subjetiva. Em última instância, por trás do “cinema de registro” desses filmes há um forte componente de subjetividade, porque no fundo é o registro desse olhar e desse sentimento dos realizadores que estão por trás de tudo.
Há um fiapo de narrativa, um “discurso do acaso” que permeia Sábado à Noite, mas no fundo no fundo nada é por acaso: nesse sábado à noite o realizador encontra exatamente aquilo o que ele já esperava. Ou seja, não encontra nada. Sábado à Noite é um percurso pela noite e ruas de Fortaleza à procura de um encontro. Encontro que nunca se realiza até o final do dia, quando num relance de poesia e de ironia, a câmera fica com os pombos, elemento-síntese dessa mistura de liberdade e solidão que o filme tanto procura.
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