Sampa
DIÁRIO ABERTO DE IK EM SAMPA
De sexta a segunda foram dias de emoção, de descobertas. Para o que nos interessa aqui, (ou seja, pularei a sexta) no sábado fui para São Paulo, acompanhar meu curta no Festival de Curtas. Ir a São Paulo foi uma experiência, porque se eu estava meio descontente com o Rio, nunca fiquei tão feliz em voltar para casa. Não que a viagem tenha sido ruim, ao contrário, mas é que eu NUNCA gostaria de morar numa cidade como São Paulo. A cidade é uma megalópole, com toda aquela confusão desumana e caótica que caracteriza o termo, e nisso é diferente do Rio. É incrível como é difícil chegar em qualquer lugar em São Paulo. Visitei a Praça da Sé e a Galeria Pajé, o que me deixou muito assustado, tal é a multidão de pessoas consumindo coisas que não tem NENHUM significado para suas vidas: ou seja, apenas um conjunto de bugigangas e quinquilharias. Cheguei tbem à Liberdade, e uau foi um grande impacto para mim caminhar por aquelas ruas, porque as ruínas de uma civilização estão lá, por trás das lojas de objetos toscos e do mundo de concreto tipicamente paulista. Uma civilização que tenta sobreviver, que tenta se preservar, mesmo que diante de um assombro de um mundo outro. Ou seja, não é a Liberdade romântica que está lá mas uma Liberdade paulista, atual, completamente imersa nesse mundo de São Paulo. Foi um grande impacto para mim porque caminhar na Liberdade me fez sentir como esse lugar está próximo dos vídeos que faço, como esse lugar me causou uma intimidade e uma distância, como parecia que eu sempre vivera ali e ao mesmo tempo que eu nunca tinha pisado ali antes, como eu estava completamente em casa e como eu era um estrangeiro ali. Andei muito pelas ruas de São Paulo, e isso foi muito bom, na verdade foi o melhor dessa viagem. Andei só, evidentemente, e daí que fiquei com uma solidão danada. Essa cidade nos faz sentir muito só, e estar fora de casa nos faz sentir muito sós e deprimido. E daí que embora tenha sido bom, eu tive a certeza de como é ruim viajar. Foi bom porque eu fiquei três dias: se fossem dez, eu não teria agüentado, certamente.
Sobre o Festival, tristeza, tristeza, tristeza... Fora alguns bons filmes que eu já tinha visto (man.road. river., isabel e o cachorro flautista, etc) só dois filmes valeram a pena. E justamente dois filmes de pessoas que eu já conheço (se bem que o Caetano eu não conhecia, mas é como se eu já o conhecesse...). O primeiro é a obra-prima NASCENTE, do Helvécio Marins Jr. Devo escrever sobre esse filme, um trabalho de enorme sensibilidade, poesia e maturidade estilística. Outro é O DIÁRIO ABERTO DE R., de Caetano Gotardo, um trabalho quase perturbador porque mostra como é difícil expressar os sentimentos, como demonstrar o afeto pode ser uma coisa tão necessária, tão íntima e tão difícil. O filme mostra essa dificuldade com uma generosidade e uma simplicidade encantadoras. O filme me intrigou por colocar a questão: como o cinema pode registrar um “diário aberto”? o que significa isso? O que está em jogo com esse ato de exposição? Perguntas que ressoam após a projeção. O filme é tbem uma declaração de princípios do que o cinema representa para o diretor, do que se busca no cinema, e isso é muito comovente. Vendo o filme temos a sensação de que tudo parece prestes a explodir, mas não, tudo cheira à normalidade, e isso é muito doloroso. Caetano segura o drama com um distanciamento mas faz um trabalho muito íntimo, e nisso achei bem mais resolvido que seu curta anterior, o bom Feito Não Para Doer.
A exibição de O POSTO tem sido para mim um exercício de humildade, e aqui falo sinceramente. Tudo para mim tem sido uma espécie de humilhação. Tudo o que eu não queria para a “carreira” desse curta tem acontecido: a estréia no Festival Universitário, a “segregação” do curta no espaço universitário do Festival de São Paulo, só falta agora não ser selecionado para Brasília, é o que falta. Pode parecer pretensão minha, mas não é não. Quando soube quem eram os jurados do Prêmio Revelação, um arrepio de alma me correu a espinha, e dei um leve sorriso por perceber como a vida pode nos ser cruel e dolorosa, como pode nos ser irônica, sarcástica. Não porque eu pudesse esperar alguma coisa do prêmio (isso é completamente ridículo), mas desse poder imbecil, e porque eu tive que escrever um texto idiota que respondia “Por que você fez esse curta?” e mandar para o júri, que só então eu descobria quem era (se eu soubesse certamente não teria mandado...) Mas viver é estar pronto para isso. O programa foi de altíssimo nível, passando junto o filme do Tim (Homens Pequenos) e Trânsito por Dora, e fiquei contente com isso. A sala completamente lotada. E foram vários amigos, o que me deixou muito feliz: parte da minha família, Sandro Saraiva, Renato, Eva. Acho que não fui embora por respeito a eles. Senão teria picado minha mula para ver Kieslowski no CCBB/SP. Isso com certeza.
O Festival é bem legal, mas o cinema que passou lá é uma merda. Lembrei do Rosemberg. O cinema brasileiro, seja em curta, média, longa, série, programa de TV, o escambau, está uma grande merda. Essa é a verdade. Cheira a podre. As pessoas só querem aparecer, não têm o que dizer, só fazem filmes pra mandar beijinho e fazer cena. Lamentável. Mas vasculhando a gente acha filmes realmente muito bons, então a esperança é essa, juntar-se aos bons, e conviver tentando não se contaminar com a mediocridade dos festivais.
Voltar foi bom. O dia hoje está sendo terrível de ruim. Não consegui falar com a menina de Vênus.
Ainda não sei se devo escrever para o Helvécio. Estou propenso a fazê-lo, mas não sei se deveria.
Queria ficar uma semana calado, sem falar ou escrever, mas não posso. Infelizmente a vida continua.
De sexta a segunda foram dias de emoção, de descobertas. Para o que nos interessa aqui, (ou seja, pularei a sexta) no sábado fui para São Paulo, acompanhar meu curta no Festival de Curtas. Ir a São Paulo foi uma experiência, porque se eu estava meio descontente com o Rio, nunca fiquei tão feliz em voltar para casa. Não que a viagem tenha sido ruim, ao contrário, mas é que eu NUNCA gostaria de morar numa cidade como São Paulo. A cidade é uma megalópole, com toda aquela confusão desumana e caótica que caracteriza o termo, e nisso é diferente do Rio. É incrível como é difícil chegar em qualquer lugar em São Paulo. Visitei a Praça da Sé e a Galeria Pajé, o que me deixou muito assustado, tal é a multidão de pessoas consumindo coisas que não tem NENHUM significado para suas vidas: ou seja, apenas um conjunto de bugigangas e quinquilharias. Cheguei tbem à Liberdade, e uau foi um grande impacto para mim caminhar por aquelas ruas, porque as ruínas de uma civilização estão lá, por trás das lojas de objetos toscos e do mundo de concreto tipicamente paulista. Uma civilização que tenta sobreviver, que tenta se preservar, mesmo que diante de um assombro de um mundo outro. Ou seja, não é a Liberdade romântica que está lá mas uma Liberdade paulista, atual, completamente imersa nesse mundo de São Paulo. Foi um grande impacto para mim porque caminhar na Liberdade me fez sentir como esse lugar está próximo dos vídeos que faço, como esse lugar me causou uma intimidade e uma distância, como parecia que eu sempre vivera ali e ao mesmo tempo que eu nunca tinha pisado ali antes, como eu estava completamente em casa e como eu era um estrangeiro ali. Andei muito pelas ruas de São Paulo, e isso foi muito bom, na verdade foi o melhor dessa viagem. Andei só, evidentemente, e daí que fiquei com uma solidão danada. Essa cidade nos faz sentir muito só, e estar fora de casa nos faz sentir muito sós e deprimido. E daí que embora tenha sido bom, eu tive a certeza de como é ruim viajar. Foi bom porque eu fiquei três dias: se fossem dez, eu não teria agüentado, certamente.
Sobre o Festival, tristeza, tristeza, tristeza... Fora alguns bons filmes que eu já tinha visto (man.road. river., isabel e o cachorro flautista, etc) só dois filmes valeram a pena. E justamente dois filmes de pessoas que eu já conheço (se bem que o Caetano eu não conhecia, mas é como se eu já o conhecesse...). O primeiro é a obra-prima NASCENTE, do Helvécio Marins Jr. Devo escrever sobre esse filme, um trabalho de enorme sensibilidade, poesia e maturidade estilística. Outro é O DIÁRIO ABERTO DE R., de Caetano Gotardo, um trabalho quase perturbador porque mostra como é difícil expressar os sentimentos, como demonstrar o afeto pode ser uma coisa tão necessária, tão íntima e tão difícil. O filme mostra essa dificuldade com uma generosidade e uma simplicidade encantadoras. O filme me intrigou por colocar a questão: como o cinema pode registrar um “diário aberto”? o que significa isso? O que está em jogo com esse ato de exposição? Perguntas que ressoam após a projeção. O filme é tbem uma declaração de princípios do que o cinema representa para o diretor, do que se busca no cinema, e isso é muito comovente. Vendo o filme temos a sensação de que tudo parece prestes a explodir, mas não, tudo cheira à normalidade, e isso é muito doloroso. Caetano segura o drama com um distanciamento mas faz um trabalho muito íntimo, e nisso achei bem mais resolvido que seu curta anterior, o bom Feito Não Para Doer.
A exibição de O POSTO tem sido para mim um exercício de humildade, e aqui falo sinceramente. Tudo para mim tem sido uma espécie de humilhação. Tudo o que eu não queria para a “carreira” desse curta tem acontecido: a estréia no Festival Universitário, a “segregação” do curta no espaço universitário do Festival de São Paulo, só falta agora não ser selecionado para Brasília, é o que falta. Pode parecer pretensão minha, mas não é não. Quando soube quem eram os jurados do Prêmio Revelação, um arrepio de alma me correu a espinha, e dei um leve sorriso por perceber como a vida pode nos ser cruel e dolorosa, como pode nos ser irônica, sarcástica. Não porque eu pudesse esperar alguma coisa do prêmio (isso é completamente ridículo), mas desse poder imbecil, e porque eu tive que escrever um texto idiota que respondia “Por que você fez esse curta?” e mandar para o júri, que só então eu descobria quem era (se eu soubesse certamente não teria mandado...) Mas viver é estar pronto para isso. O programa foi de altíssimo nível, passando junto o filme do Tim (Homens Pequenos) e Trânsito por Dora, e fiquei contente com isso. A sala completamente lotada. E foram vários amigos, o que me deixou muito feliz: parte da minha família, Sandro Saraiva, Renato, Eva. Acho que não fui embora por respeito a eles. Senão teria picado minha mula para ver Kieslowski no CCBB/SP. Isso com certeza.
O Festival é bem legal, mas o cinema que passou lá é uma merda. Lembrei do Rosemberg. O cinema brasileiro, seja em curta, média, longa, série, programa de TV, o escambau, está uma grande merda. Essa é a verdade. Cheira a podre. As pessoas só querem aparecer, não têm o que dizer, só fazem filmes pra mandar beijinho e fazer cena. Lamentável. Mas vasculhando a gente acha filmes realmente muito bons, então a esperança é essa, juntar-se aos bons, e conviver tentando não se contaminar com a mediocridade dos festivais.
Voltar foi bom. O dia hoje está sendo terrível de ruim. Não consegui falar com a menina de Vênus.
Ainda não sei se devo escrever para o Helvécio. Estou propenso a fazê-lo, mas não sei se deveria.
Queria ficar uma semana calado, sem falar ou escrever, mas não posso. Infelizmente a vida continua.
Comentários
Sim, compreendo o q vc diz no texto... esses festivais arrepiam... mas além de ser "fogueira das vaidades" de muitos, também é espaço para pessoas realmente interessadas a fazer cinema, bom cinema.
Vc é uma dessas pessoas.
Continua na luta! Determinado!
Vou ver seus filmes, só assim poderei entender melhor e aí então acreditar (ou não) em você.
Abraços...