Duas Vezes Rohmer

O SIGNO DO LEÃO
De Eric Rohmer
Estação Paissandu ter 26 julho 19:40
**½

Fui rever o primeiro longa de Rohmer. A trajetória do Rohmer é muito interessante. Os críticos da Cahiers enfim resolveram colocar a mão na massa e começaram a filmar. Vários filmes estrearam em 59: Os incompreendidos, Acossado, Os Primos (embora Chabrol já tivesse feito nas garras do vício). Todos com sucesso. Menos um, este O Signo do Leão, fracasso de público e crítica. Rohmer não era garoto, como seus companheiros de Cahiers, já tinha quase 40 anos. Ele ficou deprimido. Passou a fazer curtas em 16mm. Encontrou seu estilo, e o repetiu a exaustão, até a perfeição.

Esse primeiro longa do Rohmer é atípico, porque Rohmer não busca as invenções de linguagem tão típicas da nouvelle vague. Seu cinema é mais afeito à narrativa clássica, e dialogava de forma bastante ambígua com o cinema francês da época. Por isso foi completamente incompreendido, não tendo o espírito jovem e aventureiro de seus companheiros críticos.

Mas visto fora dessa discussão, os méritos de O Signo de Leão como obra de cinema são bastante visíveis. O filme é sobre a deambulação – física, psíquica, espiritual – de um personagem. E como sempre, o cinema moral de rohmer. O filme dialoga, portanto, com vários outros filmes que falam da decadência do Homem ante as regras do mundo social que o cercam: Ladrões de Bicicleta e O Anjo Azul, em especial. E também o extremamente falso final feliz foi tirado de A Última Gargalhada.

A decadência moral desse personagem é pontuada por um discurso moral, nunca moralista. A fisicalidade desses passos é que insere todo esse percurso de uma enorme urgência. Por isso, O Signo do Leão é como um road movie, mas sem estrada. Angustiante, o personagem entra numa espiral: torna-se um mendigo, ao final. Um filme sobre a solidão. Ou talvez um filme sobre a amizade (ou melhor, a falta de dela). Sobre um outro lado de um mundo capitalista. E repleto de um sentimento de cinema, o que é o mais importante.


A MARQUESA DE O
De Eric Rohmer
Estação Paissandu seg 25 julho 21:40
***

Enquanto O Signo do Leão é um filme de aprendizado, A Marquesa de O é um filme de maturidade. Lembrou-me muito do recente A Inglesa e o Duque. Esse A Marquesa é um dos melhores filmes de Rohmer, porque aborda a quintessência de seu cinema: como a linguagem é ardilosa, como a verdade se enconde pelas frestas da linguagem, como a razão e as convenções sociais sufocam o instinto do indivíduo até que se perca o tempo ideal para a ação. É tbem exemplo típico do seu cinema: falsamente teatral, falsamente literário. Mostra tbem a ironia extremamente sutil do diretor. O filme é bastante cruel, e não deixa de ser uma crítica aguda às hipocrisias da decadente aristocracia francesa. O humor do filme vem de um fato muito simples: o espectador sabe mais que os personagens. Dessa forma, vemo-los como completamente patetas ante a situação, que se delineia clara para nós, mas obscura para eles. Filme complexo, com tantas sutilezas, que merece reflexões e revisões.

Rohmer, mestre.

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