(TEATRO) Um Caminho Para Dois
TEATRO
Um Caminho Para Dois
De Flávio Marinho
Teatro Clara Nunes qui 21 abr 21hs
**
Enquanto o cinema nacional procura em vão alguma fórmula possível de contato com o público, de um trabalho popular, a peça de Flávio Marinho traz muitas lições para esse universo, resolvendo suas questões da forma mais simples possível. Essa simplicidade por vezes parece desgastada e superficial; por outras, seduz em sua despretensiosa descontração. A grande lição de Marinho é que a “comédia simples” de contato com o público não precisa ser vulgar (como Os Normais) nem imbecil (Mais Uma Vez Amor), mas sim se basear numa idéia da “crônica de costumes”, cuja atualidade é que dá o tom da peça. É fato que a produção do cinema é mais longa, então piadas do dia-a-dia como a de Severino Cavalcanti, etc, não servem no cinema. O recurso de falar com o público quando usado no cinema pode ter resultados duvidosos (veja Como Fazer um Filme de Amor), então cautela na metalinguagem!!! Mas enfim, creio que o grande trunfo de Marinho é uma generosidade em relação a esses personagens. Os personagens de Ormar Prado e Luciana Braga são então dois retratos do Brasil, e o país acaba virando o personagem principal da peça de Marinho. São como as duas faces da mesma moeda, um Brasil de contradições, de mudanças abruptas, de rupturas, de hipocrisias, e, claro, de relações pessoais. São dois personagens bastante diferentes que acabam se apaixonando, e suas trajetórias se cruzam, em direções opostas. Ele, do hippie esquerdista para o profissional liberal de direita; ela, da estudante alienada para a jornalista supostamente engajada. O relacionamento hoje tem uma crise. Que país é esse hoje? Marinho coloca no palco um Brasil tentando lavar uma roupa suja consigo mesmo, com suas próprias contradições. Nessa “trajetória cruzada de opostos” surge um espalho da difícil necessidade de viver e de conviver. Apesar dos desencantos e traições, o casal permanece junto. Mas por quê? Não se sabe. As hipocrisias de uma classe média brasileira são percorridas por Marinho com sutileza e alguma profundidade (o dinheiro para as viagens, as traições, a moda do japonês, um corte de cabelo, etc) embora não raras vezes a elaboração dos personagens caia num estereótipo rudimentar (o estereótipo do “riponga”, da estudante alienada, da jornalista, etc...). A peça intercala períodos de tempo (anos 70, anos 80, hoje) com grande habilidade, integrando mudanças de cenário, figurinos e postura corporal dos personagens com grande desenvoltura, de modo bastante funcional e ágil. Por fim, uma performance assustadoramente grande de Osmar Prado, como há muito eu não via. Um trabalho de enorme (repito enorme) entrega pessoal e passional, que me fez reavaliar as potencialidades desse ator (confesso que eu nunca gostei dele na telinha). O trabalho de Prado é tão encantador que oprime a tímida e marcada atuação de Luciana Braga, que acaba sumindo na peça, mas não chega a comprometer. Marinho, embora faça um modelo de teatro antigo que não me atrai, acaba mostrando vários méritos na direção, por imprimir um ritmo ágil, por colocar sua marca no texto, por saber dirigir os atores, e – especialmente – por mostrar um olhar sobre o seu ofício.
Um Caminho Para Dois
De Flávio Marinho
Teatro Clara Nunes qui 21 abr 21hs
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Enquanto o cinema nacional procura em vão alguma fórmula possível de contato com o público, de um trabalho popular, a peça de Flávio Marinho traz muitas lições para esse universo, resolvendo suas questões da forma mais simples possível. Essa simplicidade por vezes parece desgastada e superficial; por outras, seduz em sua despretensiosa descontração. A grande lição de Marinho é que a “comédia simples” de contato com o público não precisa ser vulgar (como Os Normais) nem imbecil (Mais Uma Vez Amor), mas sim se basear numa idéia da “crônica de costumes”, cuja atualidade é que dá o tom da peça. É fato que a produção do cinema é mais longa, então piadas do dia-a-dia como a de Severino Cavalcanti, etc, não servem no cinema. O recurso de falar com o público quando usado no cinema pode ter resultados duvidosos (veja Como Fazer um Filme de Amor), então cautela na metalinguagem!!! Mas enfim, creio que o grande trunfo de Marinho é uma generosidade em relação a esses personagens. Os personagens de Ormar Prado e Luciana Braga são então dois retratos do Brasil, e o país acaba virando o personagem principal da peça de Marinho. São como as duas faces da mesma moeda, um Brasil de contradições, de mudanças abruptas, de rupturas, de hipocrisias, e, claro, de relações pessoais. São dois personagens bastante diferentes que acabam se apaixonando, e suas trajetórias se cruzam, em direções opostas. Ele, do hippie esquerdista para o profissional liberal de direita; ela, da estudante alienada para a jornalista supostamente engajada. O relacionamento hoje tem uma crise. Que país é esse hoje? Marinho coloca no palco um Brasil tentando lavar uma roupa suja consigo mesmo, com suas próprias contradições. Nessa “trajetória cruzada de opostos” surge um espalho da difícil necessidade de viver e de conviver. Apesar dos desencantos e traições, o casal permanece junto. Mas por quê? Não se sabe. As hipocrisias de uma classe média brasileira são percorridas por Marinho com sutileza e alguma profundidade (o dinheiro para as viagens, as traições, a moda do japonês, um corte de cabelo, etc) embora não raras vezes a elaboração dos personagens caia num estereótipo rudimentar (o estereótipo do “riponga”, da estudante alienada, da jornalista, etc...). A peça intercala períodos de tempo (anos 70, anos 80, hoje) com grande habilidade, integrando mudanças de cenário, figurinos e postura corporal dos personagens com grande desenvoltura, de modo bastante funcional e ágil. Por fim, uma performance assustadoramente grande de Osmar Prado, como há muito eu não via. Um trabalho de enorme (repito enorme) entrega pessoal e passional, que me fez reavaliar as potencialidades desse ator (confesso que eu nunca gostei dele na telinha). O trabalho de Prado é tão encantador que oprime a tímida e marcada atuação de Luciana Braga, que acaba sumindo na peça, mas não chega a comprometer. Marinho, embora faça um modelo de teatro antigo que não me atrai, acaba mostrando vários méritos na direção, por imprimir um ritmo ágil, por colocar sua marca no texto, por saber dirigir os atores, e – especialmente – por mostrar um olhar sobre o seu ofício.
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