(FestRio) Ninguém Pode Saber
Ninguém Pode Saber
de Hirozaku Kore-Eda, Japão, 2004
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Cacildis! Mais uma grande porrada cinéfila dessa semana: Nobody knows – Ninguém pode saber, o novo filme do Kore-Eda. É um tipo de filme que só os orientais, e mais só os japoneses poderiam fazer. É um filme que fala sobre a família, sobre a rotina e sobre a dificuldade de expressar os sentimentos com uma intimidade que nos faz ficar loucos. Os primeiros quarenta minutos de filme são antológicos. O filme todo é praticamente passado dentro de casa, com a relação da mãe com os filhos. A mãe no fundo está cagando pros filhos, viaja, deixa-os sozinhos, e com isso os filhos têm que se virar, especialmente o mais velho, que tem que tomar conta dos outros, comprar comida, etc. os filhos ficam presos dentro de casa. Mas se nobody knows fosse francês seria sobre o dilema psicológico, martírio, traumas, etc dos meninos; se fosse iraniano, seria sobre a culpa, seia uma metáfora da repressão social (a maçã), só que a gente está falando do melhor cinema do mundo, do cinema oriental, e o filme acaba sendo um grande, um enorme abraço afetuoso na dificuldade de se estar longe da pessoa que mais se ama, sobre uma carência afetiva que não tem tamanho, e de como ainda assim a vida pode oferecer alternativas espetaculares, se nos apegarmos a uma intimidade. A câmera de kore-eda filma as crianças com uma intimidade, com uma segurança indescritível. A intimidade desse filme, que se passa quase todo dentro de casa, rende alguns dos momentos mais contundentes do cinema contemporâneo. O filme é feito de cinema, só isso, nada mais. Quem falar que o filme é inverossímil porque ninguém percebeu que as crianças estavam sozinhas, etc, VAI TOMAR NO CU e ver Anaconda 2 ao mesmo tempo (espero que goste e não torre o meu saco...). Ah, e quem falar que o filme é longo e poderia ter meia hora a menos, está correto, mas por outro lado, não entende nada de cinema, não entende o que seja um projeto de cinema que transcende tudo isso em busca de uma expressão pessoal e em busca de uma coerência. Todos os planos do filme estão lá: o tempo é essencial para passar uma intimidade, e não é aqueles planos longos de 20 minutos com câmera parada não, é cinema, dramaturgia.
O menino que faz o papel do irmão mais velho tem uma das atuações mais espetaculares que eu já presenciei no cinema. Com um domínio completo do tempo e do espaço, com uma economia no gestual impensável, e ainda com transformação corporal ao longo do filme, o menino criatliza o desejo de um cinema que passa pelo humano. Seria possível listar dezenas de vezes que isso ocorre: como se pinta uma unha, a cena do enterro, etc etc mas tudo isso seria em vão. Nobody Knows poderia ser neo-realista se fosse italiano, mas é cinema porque é japonês: sobre o destino, sobre a família, sobre a miserabilidade da condição humana. Quem espera mais um filme de “criancinhas fofas”, pode até gostar, mas ta longe de entender o que está em jogo nesse filme: o cinema e a vida andam de mãos juntas para kore-eda e ainda que as coisas não aconteçam como a gente espera sempre vale a pena, e a forma como kore-eda filma isso é impressionante. Acho que preciso de mais umas 18 encarnações para chegar a esse nível de existência.
de Hirozaku Kore-Eda, Japão, 2004
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Cacildis! Mais uma grande porrada cinéfila dessa semana: Nobody knows – Ninguém pode saber, o novo filme do Kore-Eda. É um tipo de filme que só os orientais, e mais só os japoneses poderiam fazer. É um filme que fala sobre a família, sobre a rotina e sobre a dificuldade de expressar os sentimentos com uma intimidade que nos faz ficar loucos. Os primeiros quarenta minutos de filme são antológicos. O filme todo é praticamente passado dentro de casa, com a relação da mãe com os filhos. A mãe no fundo está cagando pros filhos, viaja, deixa-os sozinhos, e com isso os filhos têm que se virar, especialmente o mais velho, que tem que tomar conta dos outros, comprar comida, etc. os filhos ficam presos dentro de casa. Mas se nobody knows fosse francês seria sobre o dilema psicológico, martírio, traumas, etc dos meninos; se fosse iraniano, seria sobre a culpa, seia uma metáfora da repressão social (a maçã), só que a gente está falando do melhor cinema do mundo, do cinema oriental, e o filme acaba sendo um grande, um enorme abraço afetuoso na dificuldade de se estar longe da pessoa que mais se ama, sobre uma carência afetiva que não tem tamanho, e de como ainda assim a vida pode oferecer alternativas espetaculares, se nos apegarmos a uma intimidade. A câmera de kore-eda filma as crianças com uma intimidade, com uma segurança indescritível. A intimidade desse filme, que se passa quase todo dentro de casa, rende alguns dos momentos mais contundentes do cinema contemporâneo. O filme é feito de cinema, só isso, nada mais. Quem falar que o filme é inverossímil porque ninguém percebeu que as crianças estavam sozinhas, etc, VAI TOMAR NO CU e ver Anaconda 2 ao mesmo tempo (espero que goste e não torre o meu saco...). Ah, e quem falar que o filme é longo e poderia ter meia hora a menos, está correto, mas por outro lado, não entende nada de cinema, não entende o que seja um projeto de cinema que transcende tudo isso em busca de uma expressão pessoal e em busca de uma coerência. Todos os planos do filme estão lá: o tempo é essencial para passar uma intimidade, e não é aqueles planos longos de 20 minutos com câmera parada não, é cinema, dramaturgia.
O menino que faz o papel do irmão mais velho tem uma das atuações mais espetaculares que eu já presenciei no cinema. Com um domínio completo do tempo e do espaço, com uma economia no gestual impensável, e ainda com transformação corporal ao longo do filme, o menino criatliza o desejo de um cinema que passa pelo humano. Seria possível listar dezenas de vezes que isso ocorre: como se pinta uma unha, a cena do enterro, etc etc mas tudo isso seria em vão. Nobody Knows poderia ser neo-realista se fosse italiano, mas é cinema porque é japonês: sobre o destino, sobre a família, sobre a miserabilidade da condição humana. Quem espera mais um filme de “criancinhas fofas”, pode até gostar, mas ta longe de entender o que está em jogo nesse filme: o cinema e a vida andam de mãos juntas para kore-eda e ainda que as coisas não aconteçam como a gente espera sempre vale a pena, e a forma como kore-eda filma isso é impressionante. Acho que preciso de mais umas 18 encarnações para chegar a esse nível de existência.
Comentários
abs.
luiz pretti